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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

DOUTRINA DOS ANJOS LIÇÃO 08 – Conhecendo O Inimigo.






Nos capítulos anteriores estudamos sobre os anjos que servem a Deus, obedecendo às suas ordens no desempenho de quaisquer tarefas ou atuando a favor da Igreja e dos cristãos, e, particular. Hoje daremos inicio a algumas lições que tratam dos anjos maus, a começar de Satanás, o principal entre eles. Deve-se ressaltar que o objetivo não é engrandecer ao diabo e aos demônios, mas conhecê-los melhor para poder enfrentar os ataques que promovem contra os filhos de Deus e suas obras.

Satanás, como os outros anjos, é um ser misterioso. Não podemos conhecê-lo tão profundamente como, talvez nosso espírito de curiosidade gostaria. Entretanto podemos conhecê-lo naquilo que a Bíblia nos revela dele, e isto é suficiente para nos armarmos para a luta que, incessantemente, ele trava contra nós. No capítulo que ora iniciamos aprenderemos sobre sua origem e sobre sua queda.

I.                  O ESTADO ORIGINAL DE SATANÁS.

Há dois textos bíblicos que nos servem de base para estudo – Is 14,12-17 e Ez 28,13-19. o texto de Ezequiel é que nos dá informações de algumas características originais de Lúcifer, antes da queda. Esta passagem bíblica tem uma dupla referencia:
a)                Ao príncipe de Tiro, uma cidade-reino. Historicamente é identificado como Thobal, que reinou 586 aC.
b)                Comparativamente a outro rei, chamado Lúcifer, influenciador espiritual do príncipe Thobal. Este príncipe se torna a figura de Lúcifer devido ao seu orgulho e presunção. Era arrogante e blasfemo. Considerava-se um deus e conhecedor de todos os segredos da vida (cf. Ez 28,1-10). No texto seguinte o profeta fala do mesmo personagem, mas agora com um sentido espiritual. Não é mais ao “príncipe de Tiro” que o profeta se refere, mas ao “rei do Tiro”, do qual o primeiro era uma figura.

Þ    Foi criado perfeito em sabedoria.

“Eras um selo de perfeição, cheio de sabedoria, de uma beleza acabada.” (Ez 28,12). A expressão “selo de perfeição” traduz a idéia de que era a imagem perfeita da criação divina. Lúcifer foi criado a mais bela e mais inteligente criatura de Deus. Em Isaias Lúcifer aparece como “astro brilhante, filho da aurora” (Is 14,12). O nome e os dois títulos que Isaias emprega, que significam a mesma coisa – luminoso ou brilhante – ressaltam a perfeição do estado original de Satanás. Os babilônios criam que os astros celestes ou estrelas fossem seres angelicais. Isaias aproveita-se da figura “filho da aurora” para mostrar como era Satanás antes da queda.

Þ    Foi colocado num ambiente de glória.

"Estavas no Éden, jardim de Deus, estavas coberto de gemas diversas: sardônica, topázio e diamante, crisólito, ônix e jaspe, safira, carbúnculo e esmeralda; trabalhados em ouro. Tamborins e flautas, estavam a teu serviço, prontos desde o dia em que foste criado". (Ez 28,13). Os ornamentos de jóias sugerem sua grande importância e o resplendor de sua inconfundível aparência. Assim, com resplendor, ele vivia no jardim de Deus.

Þ    Era ungido e ocupava alta posição.

"Eras um querubim protetor colocado sobre a montanha santa de Deus; passeavas entre as pedras de fogo". (Ez 28,14). Lúcifer pertencia a mais alta classe de seres angélicos – à ordem dos querubins, anjos relacionados com o trono de Deus na qualidade de protetores e defensores de Sua Santidade. Para isso Deus o escolhera – “ungido”.

Þ    Tinha uma conduta perfeita.

"Foste irrepreensível em teu proceder desde o dia em que foste criado, até que a iniqüidade apareceu em ti". (Ez 28,15). Até o momento em que nele se “achou iniqüidade”, nada havia que desabonasse, nem diante dos outros anjos, nem diante  de Deus, sua conduta. Este era o estado original de Satanás. Deus o criou assim.

II.               A SUA NATUREZA E PERSONALIDADE.

Embora já tenhamos abordado questões sobre a natureza e personalidade os anjos, é bom ressaltar aspectos particulares da natureza e personalidade de Satanás.

Þ    Ele é uma criatura.

Em Ez 28,15 encontramos esta declaração “desde o dia em que foste criado”. Isto significa dizer que ele não possui atributos que pertencem somente a Deus Criador, tais como Onipresença, onipotência e onisciência. Embora seja um ser poderoso, é uma criatura, sujeita às limitações impostas pelo Criador.

Þ    Ele é um ser espiritual.

Satanás pertencia à ordem dos anjos designados querubins – “Eras um querubim protetor colocado sobre a montanha santa de Deus.” (Ez 28,14). A natureza de todos os anjos é espiritual. Por isso é que ele é chamado de “o deus deste século” (2 Cor 4,4) e de “o príncipe da potestade do ar” (Ef 2,2).

Þ    Ele é uma pessoa.

Do mesmo modo que outros anjos, Satanás possui traços da personalidade. Ele se mostra inteligente - "Mas temo que, como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim se corrompam os vossos pensamentos e se apartem da sinceridade para com Cristo". (2Cor 11,3); ele exibe suas emoções - "Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo;" (Lc 22,31); ele demonstra que possui vontade própria - "e voltem a si, uma vez livres dos laços do demônio, que os mantém cativos e submetidos aos seus caprichos". (2Tm 2,26); "Tu dizias: Escalarei os céus e erigirei meu trono acima das estrelas. Assentar-me-ei no monte da assembléia, no extremo norte". (Is 14,13). Em dois episodio bíblico um no 1.º e outro no 2.º Testamento, a personalidade de Satanás é claramente evidenciada. No livro de Jó ele aparece como uma pessoa dialogando e mostrando o intento do seu coração – Jó 1 – Em Mt 4,1-11 ele aparece em cena dialogando com o Mestre, agindo caracteristicamente como pessoa. Não podemos negar a personalidade de Satanás, exceto adotando argumentos que nos compeliram a negar também a existência dos anjos, a personalidade do Espírito e a do Pai.

Þ    Ele é um ser moral e responsável.

Se Satanás fosse meramente uma personificação do mal, não seria moralmente responsável por seus atos, uma vez que  não existiria nenhum ser para se responsabilizar. Mas Satanás é responsabilizado pelo Senhor Jesus, do mesmo modo  que os homens são  responsabilizados por seus atos - "Voltar-se-á em seguida para os da sua esquerda e lhes dirá: - Retirai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno destinado ao demônio e aos seus anjos". (Mt 25,41). Esta passagem também no lembra que negar a realidade de Satanás representa negar a verdade das palavras de Cristo.

III.           A QUEDA DE LUCIFER.

“Foste irrepreensível em teu proceder desde o dia em que foste criado, até que a iniqüidade apareceu em ti". (Ez 28,15). É com esta simplicidade que o profeta relata a origem do pecado e da queda de Lúcifer. Ele, que havia sido criado perfeito. Abrigava em seu coração a iniqüidade. Isaias da mais detalhes sobre a queda deste anjo – Is 14,12-17. Embora seja tipológica. Pois fala do rei Nabucodonosor como figura de Lúcifer, esta escritura descreve os passos da queda de Lúcifer.

Þ    “Eu subirei aos céus” (Is 14,13).

Como guardião da santidade de Deus ele tinha acesso ao céu, mas esta declaração expressa o seu desejo de estar acima de toda a criação e acima do Criador.

Þ    “Acima das estrelas de Deus exaltarei meu trono” (Is 14,13).

O sentido desta expressão depende do entendimento do que sejam as “estrelas”. Neste texto parece se referir a anjos - "sob os alegres concertos dos astros da manhã, sob as aclamações de todos os filhos de Deus?" (Jó 38,7); "Ondas furiosas do mar, que arrojam as espumas da sua torpeza! Estrelas errantes, para as quais está reservada a escuridão das trevas para toda a eternidade!" (Jd 1,13); "Varria com sua cauda uma terça parte das estrelas do céu, e as atirou à terra. Esse Dragão deteve-se diante da Mulher que estava para dar à luz, a fim de que, quando ela desse à luz, lhe devorasse o filho". (Ap 12,4). Sendo assim, o desejo de Satanás aqui manifesto era se colocar acima de todos os anjos.

Þ    “No monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte” (Is 14,12).

O “monte” é uma referencia ao lugar do trono de Deus. Esta declaração representa a ambição de Satanás de se colocar como governante de todos os povos, no lugar de Deus.

Þ    “Subirei acima das mais altas nuvens” (Is 14,13).

Ele ambicionava a glória que pertence a Deus . “Nuvens” são geralmente associadas à presença gloriosa de Deus - "Enquanto Aarão falava a toda a assembléia dos israelitas, olharam para o deserto e eis que apareceu na nuvem a glória do Senhor!" (Ex 16,10); "Ei-lo que vem com as nuvens. Todos os olhos o verão, mesmo aqueles que o traspassaram. Por sua causa, hão de lamentar-se todas as raças da terra. Sim. Amém". (Ap 1,7).

Þ    “Serei semelhante ao Altíssimo” (Is 12,14).

Lúcifer, “eras um selo de perfeição” (Ez 28,12), agora queria ser igual a Deus. Ele queria assumir autoridade e o controle do mundo, o que é prerrogativa exclusiva de Deus.

O pecado de satanás é mais horrendo, ao se considerar o grande privilégio, inteligência e posição que tinha. Seu pecado é também mais terrível por causa dos seus efeitos sobre os outros. Ele afetou outros anjos, que levou atrás de si – “Varria com sua cauda uma terça parte das estrelas do céu, e as atirou à terra.” 12,4a; afetou todos os homens - "que cometestes outrora seguindo o modo de viver deste mundo, do príncipe das potestades do ar, do espírito que agora atua nos rebeldes". (Ef 2,2); afetou as nações - "Atirou-o no abismo, que fechou e selou por cima, para que já não seduzisse as nações, até que se completassem mil anos. Depois disso, ele deve ser solto por um pouco de tempo". (Ap 20,3).

A queda de Satanás lhe trouxe conseqüências irreversíveis

·        Ele tornou-se o primeiro pecador e pai do pecado - "Aquele que peca é do demônio, porque o demônio peca desde o princípio. Eis por que o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do demônio". (1Jo 3,8).
·        É também o pai da mentira - "Vós tendes como pai o demônio e quereis fazer os desejos de vosso pai. Ele era homicida desde o princípio e não permaneceu na verdade, porque a verdade não está nele. Quando diz a mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira". (Jo 8,44). A primeira frase dele registrada na Bíblia não só põe em dúvida, mas contradiz abertamente o que Deus dissera. Deus tinha dito – “Certamente morreras” (Gn 2,17); a serpente disse: “É certo que não morrerás”. (Gn 3,4).
·        Está sob condenação eterna - "Ele apanhou o Dragão, a primitiva Serpente, que é o Demônio e Satanás, e o acorrentou por mil anos. "O Demônio, sedutor delas, foi lançado num lago de fogo e de enxofre, onde já estavam a Fera e o falso profeta, e onde serão atormentados, dia e noite, pelos séculos dos séculos". (Ap 20,2.10).

CONCLUINDO

   Hoje em dia se tem cometido dois graves erros quando à existência de Satanás:

Þ    Negar a sua existência real, considerando-o como uma criação do homem, uma espécie de “força negativa da mente”. Certamente que uma das táticas de Satanás é fazer as pessoas não acreditarem que ele existe. Se ele não é elevado a sério, em conseqüência o pecado também não é.

Þ    Mistificar a crença nele, tratando-o como uma “energia ou figura espiritual”. À luz da Bíblia descobrimos que Satanás é uma pessoa, uma criatura, que deliberadamente optou rebelar-se contra Deus, rejeitando sua soberania e autoridade. Ele existe e está vivo, operando para influenciar o mundo a se voltar contra Deus.

O que aconteceu a Lúcifer deve servir de advertência aos homens. Seu pecado foi orgulho, consumado na rebelião contra Deus. As conseqüências que sofreu são semelhantes às que o homem soberbo também sofre, se não se arrepende e confessa a Deus , o seu pecado, reconhecendo a soberania de Jesus Cristo.

MARCO ANTONIO LANA (TEÓLOGO)

sábado, 23 de fevereiro de 2013

GÊNESIS - 04 – A TEMPESTADE CHEGA.




Nos versículos iniciais de Gênesis 5, temos um relato histórico do modo de viver dos seres antediluvianos. Deste modo, percebemos a humanidade criada por Deus vivendo sob alguns aspectos à luz do objetivo impar de Deus, com múltiplas experiências:

1.    No viver com Deus –

Temos Enoque como referencial, representando alguém que teve sua vida espiritual, pessoal, intelectual permeada pela presença divina; era diferente dos demais de sua época (vv. 21-24).

2.    No viver familiar –

Havia amplo crescimento reprodutivo, gerando filhos e filhas.

3.    No viver secular –

Tinham consciência das dificuldades próprias da época. Viviam na expectativa de alivio para a angustia e estresse próprios daqueles dias. Percebemos esta tensão nas palavras de Lamec que, ao ser agraciado com a paternidade aos 182 anos  (bastante jovem para a época), desabafa a cerca de suas necessidades – "ao qual pôs o nome de Noé, dizendo: “Este nos trará, em nossas fadigas e no duro labor de nossas mãos, um alívio tirado da terra mesma que o Senhor amaldiçoou.”" (Gn 5,29) – consolo para o exaustivo trabalho nas buscas incessantes de oportunidades, consolo das fadigas das próprias mãos e livramento da maldição sobre a qual estava encerrada a própria terra. Interessante observarmos que é neste contexto conflituoso que nasce Noé; e seu pai Lamec antevê nele o consolo para estas lutas.

Na perspectiva dos antigos, a história é uma sucessão de gerações, de modo que contar a história, é contar a história das famílias. Notemos que a geração humana transmite para cada novo ser humano a originalidade com que Deus criou Adão: à imagem e semelhança de Deus (Gn 5,1-3). Assim, a salvação se mostra já presente na história. Para o Antigo Testamento, ser feliz é viver bastante. Salientando a idade, o texto quer mostrar o seguinte: à medida que o mal cresce, o homem é menos feliz, ou seja, vive menos (cf. Gn 6,3): antes do dilúvio, vive-se de 700 a 1.000 anos; depois do dilúvio, de 200 a 600 anos (cf. Gn 11,10-26); a partir de Abraão, de 100 a 200 (cf. Gn 23,1 etc.); mais tarde, de 70 a 80 anos (cf. Sl 90,10).” – Bíblia Pastoral.

I.              O ESTADO DA HUMANIDADE. (Gn 6:1-12).

Para um mundo jovem, o pecado atingira proporções imensuráveis – “Um abismo chama outro abismo ao ruído das tuas catadupas; todas as tuas ondas e vagas têm passado sobre mim”. (Sl 42,7). Os homens e as mulheres daqueles dias encontravam-se num estado de desintegração moral e espiritual, separados da comunhão com Deus e entregues às próprias paixões e concupiscências (Gn 1-4), portanto, em pecado – condição do homem sem a presença de Deus. Deus então olhou esses “homens” e constatou:



1.    O que Deus viu.  

a)    A carnalidade latente (v3).
b)    As maldades humanas em crescimento vertiginoso (v 5a).
c)    A persistência maldosa dos desígnios do coração humano (v. 5b).

2.    O que Deus fez.

Deus então analisou esses homens, se arrependeu de havê-los criado, e resolveu:

a)    Tirar a ação do Espírito Santo sobre o Homem – v3a.
b)    Diminuir o tempo de vida – v3b.
c)    Fazer desaparecer o homem da face da terra – v 7.

Novamente, numa situação conflituosa, Noé reapareceu na história bíblica, de forma decisiva – "Noé, entretanto, encontrou graça aos olhos do Senhor". (Gn 6,8).

Dessa vez não temos mais um pai terreno olhando suas próprias does e ansioso por diminuí-las, mas um pai Celeste, Deus, com a justiça derramando das próprias mãos; em busca de  uma solução não particular, mas universal. Ele também achou em Noé a graça” inexistente em seus contemporâneos (v. 9). Conseqüentemente começou-se naquele momento o julgamento da humanidade.

6,1-8: A auto-suficiência chega ao máximo da pretensão: o homem começa a considerar-se um deus ou semi-deus, projetando uma super-humanidade independente do projeto original de Deus. Vendo sua criação desfigurada, Javé decide exterminá-la. Tudo perdido? Não. A história vai continuar através de Noé, o homem justo.  Inspirada nas inundações periódicas dos grandes rios, a narrativa do dilúvio é típica das antigas culturas médio-orientais. Os autores bíblicos a utilizaram por causa do seu significado simbólico: o dilúvio é uma volta ao caos primitivo (compare Gn 1,6-30 com 6,17 e 7,18-24). Contudo, qual é o dilúvio que acontece na história? São os acontecimentos catastróficos gerados pela auto-suficiência, que chega a formas tão extremadas que produz o caos na natureza e no mundo humano. O texto é também uma apologia do justo: este sabe discernir a catástrofe e tomar uma atitude para sobreviver e preservar a vida. É através do justo que a história continua.(Bíblia Pastoral)


II.            A ACA PARA OS ELEITOS: JULGAMENTO E SALVAÇÃO.

A situação pecaminosa da humanidade exigia medidas radicais; fossem condenatórias ou salvificas. A arca naquele momento representava a alternativa transicional – julgamento à salvação para Noé e sua família. Embora estivessem livres das águas  diluvianas, no aspecto condenatório, eles  estariam sob as conseqüências das mesmas passando por:

1.    Um julgamento parcial e simultâneo ao:

a)    Construir a Arca – Gn 14-16 – a obediência seria fundamental quanto ao material, estrutura e desenho da arca, como também quanto aos que nela entrariam (Gn 6,19-22).
b)    Entrar na arca – este seria  o momento de dar as costas para o mundo conhecido e entregar-se pela fé numa rendição incondicional àquele que via  Noé como justo no meio de uma geração corrupta – Gn 7,1.
c)    Esperar – para começar a chuva; “um, dois, três... seis dias e ...”... nada de chuva. O que representaram para Noé esses dias de espera?

"No ano seiscentos da vida de Noé, no segundo mês, no décimo sétimo dia do mês, romperam-se naquele dia todas as fontes do grande abismo, e abriram-se as barreiras dos céus. "A chuva caiu sobre a terra durante quarenta dias e quarenta noites". (Gn 7,11-12).

"As fontes do abismo fecharam-se, assim como as barreiras dos céus, e foram retidas as chuvas". (Gn 8,2).

O texto é repetitivo porque mistura duas tradições, de épocas diferentes, sobre o dilúvio. A comparação com Gn 1,1-10 mostra que o dilúvio significa uma volta ao caos primitivo; quando a humanidade destrói em si a imagem de Deus, a conseqüência é a destruição de todo o mundo criado.” – Bíblia Pastoral.

2.    Uma purificação completa – Gn 7,21-23.

a)    Seu preço – extermínio de todos os seres (Gn 7,23);
b)    Exceção – Noé e os que com ele estavam (Gn 7,23b);
c)    Resultado duplo – salvação e condenação (Gn 7,21-23).

Salvação – para Noé e sua família, que ousaram crer e obedecer. Porque foram diferentes de seus contemporâneos – "Pela fé na palavra de Deus, Noé foi avisado a respeito de acontecimentos imprevisíveis; cheio de santo temor, construiu a arca para salvar a sua família. Pela fé ele condenou o mundo e se tornou o herdeiro da justificação mediante a fé". (Hb 11,7).

III.           A ARCA PARA OS IMPIOS: JULGAMENTO E CONDENAÇÃO.

"Pela fé na palavra de Deus, Noé foi avisado a respeito de acontecimentos imprevisíveis; cheio de santo temor, construiu a arca para salvar a sua família. Pela fé ele condenou o mundo e se tornou o herdeiro da justificação mediante a fé". (Hb 11,7).

Convém salientar que os humanos daquela época estavam tão “entregues a si mesmo”, aos cuidados do mundo – "Nos dias que precederam o dilúvio, comiam, bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. E os homens de nada sabiam, até o momento em que veio o dilúvio e os levou a todos. Assim será também na volta do Filho do Homem". (Mt 24,38-39), que não se aperceberam da sentença mortal que pairava sobre eles –  "se não poupou o mundo antigo, e só preservou oito pessoas, dentre as quais Noé, esse pregador da justiça, quando desencadeou o dilúvio sobre um mundo de ímpios;" (2Pd 2,5).

É bom notar a tipologia da arca como símbolo de Jesus - em Cristo a salvação para todos os que nele creêm.



IV.          ENCERRADO O PRIMEIRO JULGAMENTO DA HUMANIDADE.

Aparecia um novo mundo – "E eis que pela tarde ela voltou, trazendo no bico uma folha verde de oliveira. Assim Noé compreendeu que as águas tinham baixado sobre a terra". (Gn 8,11).

Descia uma nova família da arca – certamente não mais com entrara, pois quem testemunhara estas maravilhas certamente não seria mais o mesmo. (“um homem não entra duas vezes no mesmo rio; da segunda vez não é o mesmo homem nem o mesmo rio” – Heracílito de Éfeso, séc. Vi aC.).

Temos, nesse momento, a realização da primeira celebração no novo mundo - "E Noé levantou um altar ao Senhor: tomou de todos os animais puros e de todas as aves puras, e ofereceu-os em holocausto ao Senhor sobre o altar". (Gn 8,20).

O Senhor recebe, aspira, e conclui: “Doravante, não mais amaldiçoarei a terra por causa do homem porque os pensamentos do seu coração são maus desde a sua juventude, e não ferirei mais todos os seres vivos, como o fiz.” – Gn 8,21.


Através do justo, Deus começa uma nova criação (comparar 9,1-7 com Gn 1,28-30). A nova criação começa com uma oferta a Javé, que não deixa o homem ser dominado pelo caos. Ele promete nunca mais destruir a sua criação: doravante, ele aceita a ambigüidade humana (v. 21), que também é responsável pela ambigüidade do mundo e da história. Experimenta-se a graça na estabilidade da ordem natural, não obstante o contínuo pecar do homem.– Bíblia Pastoral.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

DOUTRINA DOS ANJOS - LIÇÃO 07 – Os Anjos A Serviço Da Igreja e dos Crentes.



No capitulo anterior vimos que no 1.º Testamento eles aparecem atuando em varias ocasiões e no 2.º Testamento encontramos registros da atuação deles em relação a Jesus e à Igreja Primitiva. Alem disso, também estudamos sobre três aspectos do ministério especial dos anjos: adoram e louvam a Deus; comunicam aos homens os propósitos de Deus; executam os juízos de Deus

Neste capitulo estaremos abordando o ministério dos anjos em relação à igreja e aos crentes. Muito ensino errado tem sido ministrado e é necessário que nos dediquemos ao estudo desta questão, para nos firmarmos na verdade. Que a Bíblia afirma que os anjos estão a serviço dos cristãos, é verdade. Mas como agem? Cada cristão tem o seu próprio anjo? Estas e outras perguntas é que nos introduzirão ao presente capítulo.

I.                  OS ANJOS SERVINDO A IGREJA.

Antigamente os anjos agiam em favor da Igreja. Já constatamos esta verdade no capitulo anterior. Mas isso foi no passado. E no presente como agem?

Terão alguma atuação em favor da Igreja nu futuro?

Þ    Os anjos observem os cristãos.

Paulo afirma - "Porque, ao que parece, Deus nos tem posto a nós, apóstolos, na última classe dos homens, por assim dizer sentenciados à morte, visto que fomos entregues em espetáculo ao mundo, aos anjos e aos homens". (1Cor 4,9). Isto significa que os anjos são espectadores dos eventos da vida dos cristãos. Esta observação angelical, entretanto, não é passiva. Certamente que os anjos de Deus vigiam para que os cristãos não sofram, tanto físicos como emocionalmente, alem da conta, os ataques de Satanás. Todos os crentes estão em constante perigo, e os anjos os protegem.

O apostolo também menciona - "Por isso a mulher deve trazer o sinal da submissão sobre sua cabeça, por causa dos anjos". (1Cor 11,10), que as mulheres coríntios deviam trazer véu sobre a cabeça por causa dos anjos. Provavelmente essas palavras significam para agradá-los, para não ofendê-los com uma conduta indecorosa, pois esperam da igreja a mesma atitude de reverencia que têm diante de Deus - "Os serafins se mantinham junto dele. Cada um deles tinha seis asas; com um par (de asas) velavam a face; com outro cobriam os pés; e, com o terceiro, voavam". (Is 6,2). Esse texto – 1Cor 11,10 – também revela o interesse dos anjos na vida cotidiana da Igreja.

Por outro lado, a Igreja é que torna conhecida - "Assim, de ora em diante, as dominações e as potestades celestes podem conhecer, pela Igreja, a infinita diversidade da sabedoria divina," (Ef 3,10). Ilustrando esta verdade, John Stott diz o seguinte:

“É como uma encenação de um grande drama. A história é o teatro, o mundo é o palco, e os membros da igreja em todos os países são os atores. O próprio Deus escreveu a peça e a dirige e a produz. Ato após ato, cena após cena, a história continua a desdobrar-se. Mas quem está no auditório? São as inteligências cósmicas, os principados e potestades nos lugares celestiais. Devemos pensar neles como sendo os espectadores do drama da salvação.” – John Stott.

Mesmo sendo superior aos homens em sabedoria e poder, os anjos não são oniscientes. Por isso nenhuns acontecimentos poderiam adquirir do plano de salvação do homem, a não ser observando o desenrolar dos acontecimentos da história.

Þ    Os anjos não pregam o Evangelho.

A tarefa de pregar o Evangelho é do homem. Jesus deu a entender assim quando contou a parábola de Lázaro e o rico. Ao negar o pedido do rico, de mandar alguém á sua casa paterna para dar testemunho a seus irmãos, a fim de que não fossem também para o inferno. Abraão respondeu - "Se não ouvirem a Moisés e aos profetas, tampouco se deixarão convencer, ainda que ressuscite algum dos mortos". (Lc 16,31). 

Anunciar a mensagem de salvação é privilégio dos homens, que, se os fazem, são aventurados - "E como pregarão, se não forem enviados, como está escrito: Quão formosos são os pés daqueles que anunciam as boas novas (Is 52,7)?" (Rm 10,15). É tão significativa esta tarefa e tão dignos são os que realizam que os anjos desejam envolver-se nela - "Foi-lhes revelado que propunham não para si mesmos, senão para vós, estas revelações que agora vos têm sido anunciadas por aqueles que vos pregaram o Evangelho da parte do Espírito Santo enviado do céu. Revelações estas, que os próprios anjos desejam contemplar". (1Pd 1,12). Mas a eles não é dado este privilégio. Que é exclusivo da Igreja.

Þ    Os anjos estarão presentes nos acontecimentos da Segunda Vinda de Cristo.

Mesmo antes de Cristo voltar à terra, os anjos terão participação neste grande evento. Um arcanjo anunciará o tempo da volta de Cristo e ouvindo a sua voz os crentes em Cristo ressuscitarão - "Quando for dado o sinal, à voz do arcanjo e ao som da trombeta de Deus, o mesmo Senhor descerá do céu e os que morreram em Cristo ressurgirão primeiro". (1Ts 4,16).

Quando o Senhor voltar, os anjos O acompanharão - "Quando o Filho do Homem voltar na sua glória e todos os anjos com ele, sentar-se-á no seu trono glorioso". (Mt 25,31). Na sua volta pessoal os anjos "Seguiam-no em cavalos brancos os exércitos celestes, vestidos de linho fino e de uma brancura imaculada". (Ap 19,14). A presença dos seres angelicais com o Senhor indica a glória  com que se revestirá o acontecimento. Mas não é só esta a tarefa a ser cumprida pelos anjos na segunda vinda de Cristo. Eles também atuaram na execução do julgamento dos homens ímpios - "O Filho do Homem enviará seus anjos, que retirarão de seu Reino todos os escândalos e todos os que fazem o mal e os lançarão na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes." (Mt 13,41-42).

Os anjos ainda estarão presentes na prisão de Satanás por mil anos – "Vi, então, descer do céu um anjo que tinha na mão a chave do abismo e uma grande algema. Ele apanhou o Dragão, a primitiva Serpente, que é o Demônio e Satanás, e o acorrentou por mil anos. Atirou-o no abismo, que fechou e selou por cima, para que já não seduzisse as nações, até que se completassem mil anos. Depois disso, ele deve ser solto por um pouco de tempo.". (Ap 20,1-3).

II.               OS ANJOS SERVINDO OS CRENTES.

Os crentes em cristo têm os anjos a seu serviço. Nós não podemos vê-los, como já dissemos, porque são seres espirituais e, por isso, invisível. Eles sim, nos podem observar. E do mesmo modo que atuaram em benefício de crentes, em particular, nos tempos neotestamento, ainda hoje atuam.

Þ    Os anjos se alegram com a salvação dos homens.

"Digo-vos que haverá júbilo entre os anjos de Deus por um só pecador que se arrependa". (Lc 15,10). A alegria do Pai celestial é tão grande ao receber um filho perdido, que ele compartilha dela com as criaturas celestiais.

Þ    Os anjos cuidam dos eleitos quando estes morrem.

Jesus declarou quanto contou a parábola do rico e de Lázaro, que o mendigo, ao morre "foi levado pelos anjos ao seio de Abraão." (Lc 16,22). Podemos deduzir daí que quando um cristão passa desta para outra vida é conduzido pelos anjos à presença do Pai. Quanto ao texto - "Ora, quando o arcanjo Miguel discutia com o demônio e lhe disputava o corpo de Moisés, não ousou fulminar contra ele uma sentença de execração, mas disse somente: Que o próprio Senhor te repreenda!" (Jd 1,9), que menciona a disputa do corpo de Moisés pelo diabo e o arcanjo Miguel, a lição que tiramos é que até a situação de morte, o inimigo tem interesse nos fieis, os acusa e os requer para si.

Um comentarista bíblico, tentando esclarecer este versículo, escreveu o seguinte:

“Quando Moisés morreu o arcanjo Miguel foi enviado por Deus para enterrá-lo. Mas o diabo o disputou seu direito de assim fazer, pois Moisés tinha sido um assassino - "Moisés, voltando-se para um e outro lado e vendo que não havia ali ninguém, matou o egípcio e ocultou-o na areia". (Ex 2,12). E portanto seu corpo pertencia, por assim dizer, ao diabo. Alem disso o diabo alegou ter autoridade sobre a matéria, e o corpo de Moisés, naturalmente, encaixava-se nesta categoria. Mas mesmo sob tal provocação como diz a história, Miguel não tratou o diabo com desrespeito. Simplesmente deixou o caso com Deus”. -  Green.

Não somos autorizados a dizer, mesmo diante deste texto, que os anjos são enviados para  cuidar dos corpos dos eleitos. No caso de Moisés, podemos crer, o objetivo do Senhor ao enviar um anjo era evitar a idolatria em relação ao corpo de Moisés e, ao mesmo tempo, demonstrar o trato especial que Ele despertou a este Seu servo. Por outro lado, considerando o contexto de Judas - "Ora, quando o arcanjo Miguel discutia com o demônio e lhe disputava o corpo de Moisés, não ousou fulminar contra ele uma sentença de execração, mas disse somente: Que o próprio Senhor te repreenda!" (Jd 1,9), aprendemos que se os anjos são cuidadosos naquilo que afirmam, quanto mais o devemos ser.

Þ    Os anjos protegem os eleitos.

No Salmo – “O anjo do Senhor acampa-se ao redor dos que o temem, e os livra.” (Sl 34,7). Já podemos notar, em textos tanto do 1.º e 2.º Testamento, que servos do Senhor foram protegidos por anjos. Jesus declarou que, se quisesse, pediria ao Pai e Ele “me enviaria imediatamente mais de doze legiões de anjos” (Mt 26,53).

Podemos crê que os anjos estão a serviço de Deus, ministrando proteção aos santos. Existem anjos que guardam; o que não existe é “anjo da guarde”. Esta é uma idéia com base em fábulas rabínicas e na filosofia oriental. Não há fundamento bíblico  para esta noção popular de “anjo da guarda”. Os textos geralmente citados  como base - "Guardai-vos de menosprezar um só destes pequenos, porque eu vos digo que seus anjos no céu contemplam sem cessar a face de meu Pai que está nos céus". (Mt 18,10); "Disseram-lhe: Estás louca! Mas ela persistia em afirmar que era verdade. Diziam eles: Então é o seu anjo". (At 12,15). Este ultimo texto registra a suposição dos crentes primitivos, ainda influenciados pelas crenças judaicas, de que o anjo de Pedro aparecera. A suposição deles era falsa, pois era mesmo Pedro, em carne e osso, que aparecera, solto que foi da prisão. No primeiro texto, a intenção de Jesus não é afirmar a existência de anjos pessoais, mas sim mostrar o quanto são importantes “os pequeninos” diante de Deus, razão por que também os devemos considerar importantes.

Þ    Os anjos não devem ser adorados.

Os anjos não aceitam adoração. No Apocalipse - "Fui eu, João, que vi e ouvi estas coisas. Depois de as ter ouvido e visto, prostrei-me aos pés do anjo que as mostrava. Mas ele me disse: Não faças isto! Sou um servo como tu e teus irmãos, os profetas, e aqueles que guardam as palavras deste livro. Prostra-te diante de Deus." (Ap 22,8-9) – João conta que, estarrecido diante da visão do novo céu e nova terra e das palavras proferidas por um anjo, prostrou-se a seus pés para adora-lo. Mas o anjo lhe disse: “Não faças isto! Sou um servo como tu e teus irmãos, os profetas, e aqueles que guardam as palavras deste livro. Prostra-te diante de Deus.” . Somente Deus deve ser adorado. Qualquer adoração à criatura, em vez de o Criador, é idolatria. Esta é a razão por que Paulo condena - "Ninguém vos roube a seu bel-prazer a palma da corrida, sob pretexto de humildade e culto dos anjos. Desencaminham-se estas pessoas em suas próprias visões e, cheio do vão orgulho de seu espírito materialista," (Cl 2,18). Talvez os colossenses achassem que Deus está longe demais e, por isso, precisavam da intermediação de anjos para se chegar a Ele. Deus não está distante e nem é necessário que anjos sejam mediadores entre Ele e os homens por que o Filho, superior aos anjos já se tornou, uma vez por todas, o Mediador - "Porque há um só Deus e há um só mediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo, homem" (1Tm 2,5).

CONCLUINDO

É bom sabermos que os anjos são “espíritos ministradores enviados para serviço, a favor dos que hão de herdar a salvação”. (Hb 1,14). Esta palavra traz consolo! Os anjos nos servem. Servem à Igreja e a cada Cristão em particular! Contudo, devemos ter o cuidado para não aceitar nada além daquilo que a palavra de Deus ensina a respeito dos anjos.

MARCO ANTONIO LANA (TEÓLOGO)


domingo, 17 de fevereiro de 2013

GÊNESIS - LIÇÃO 03 – INVEJA E GRATIDÃO.




Caim e Abel personalizam o título desta lição. Caim é a personalização da inveja; Abel, da gratidão. Ambos nasceram fora do Éden, eram filhos não do Adão inocente, mas, sim, do Adão culpado. Entraram no mundo como participantes da natureza do seu pai. Natureza caída, arruinada, irremediavelmente natureza má. "O que nasceu da carne é carne, e o que nasceu do Espírito é espírito". (Jo 3,6).

De tudo o que se possa dizer, segue-se que Abel não era diferente, em natureza, do seu irmão Caim. A distinção entre eles não era baseada em coisa alguma da sua natureza ou das circunstâncias, porque, quanto a estas, não há diferença. Em Adão, pai de Caim e Abel, "todos pecaram e todos estão privados da glória de Deus," (Rm 3,23). Em que consistiu, então, a grande diferença? A resposta é: nos seus sacrifícios (Gn 4,3-5). O capitulo 11 de hebreus apresenta-nos o assunto de modo distinto e compreensível: "Pela fé Abel ofereceu a Deus um sacrifício bem superior ao de Caim, e mereceu ser chamado justo, porque Deus aceitou a sua oferta. Graças a ela é que, apesar de sua morte, ele ainda fala". (Hb 11,4). Mas por que Deus não aceitou o sacrifício de Caim? Caim ofereceu ao Senhor o fruto da terra amaldiçoada, e isto também sem sangue para remover a maldição. Hebreus 9,22 diz: "Aliás, conforme a lei, o sangue é utilizado, para quase todas as purificações, e sem efusão de sangue não há perdão". A diferença entre a oferta de Caim e a de Abel é dupla: uma diferença interior; isto é, a disposição do coração. Também uma diferença exterior; isto é, a ausência do cordeiro, tipo de Jesus Cristo – "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo". (Jo 1,29).

Acontecida à tragédia da queda, deu-se uma divisão insanável. Desde esse dia duas grandes forças se protagonizam no mundo, numa luta sem tréguas. A divisão e o protagonismo apareceram já no seio da primeira família. O progresso do pecado não se faz esperar. Corrompida a natureza, o tentador deixou o homem entregue a si mesmo. A semente lançada tinha germinado e, agora, vai crescendo assustadoramente. O mal que vai crescendo apresenta os seguintes aspectos:

              I.      FORMALISMO E EXTERIORIDADE DO CULTO.

Qual foi o erro de Caim? Foi uma duplicidade: por fora, ato de culto; por dentro, coração afastado de Deus. A narrativa bíblica mostra duas coisas:

1.      Deus não olhou para Caim, nem para seu sacrifício.

A razão é simples: Deus olha primeiro para o coração e, só depois disso, achando o coração reto, olha aquilo que está dentro.

2.      Caim não fez bem.

Se tivesse feito bem, Deus teria olhado para ele. (Is 1,13-15; Jr 17,9-10).

A carta aos Hebreus diz que Abel ofereceu maior sacrifício pela fé. O que agradou a Deus, em Abel, foi um fato interior, um fato do coração – a fé.

Era exatamente o que faltara a Caim. Por fora, Caim era um homem religioso; por dentro, um homem divorciado de Deus, que procurava curar o mal com o culto exterior.
            II.      INIMIZADE CONTRA O HOMEM E AVERSÃO A DEUS.

Caim não foi tentado pelo diabo. O que provocou o seu ato de violência foi o ato de Abel. Fatos e circunstancias que teriam estimulado em outras pessoas a prática do bem, despertaram em Caim as manifestações do mal. O mal já estava nele. Caim amava a si mesmo; era um egocêntrico e ególatra, por isso odiava a seu irmão e tinha aversão às coisas de Deus. Abel não lhe fez nenhum mal, mas Caim o aborreceu a ponto de tirar-lhe a vida. Foi o primeiro homicídio da bíblia. Para reforçar este aspecto do mal seria boa uma leitura no texto de Mt 5,21-48.

O relacionamento entre os irmãos Caim e Abel é o oposto daquilo que Deus espera do relacionamento entre os homens: a fraternidade, em que cada um é protetor do seu próximo. A auto-suficiência introduz a rivalidade e a competição nesse relacionamento: a fraternidade é destruída e, em vez de proteger, o homem fere e mata o seu próximo.

          III.      VIOLENCIA.

A simples aversão não tardou a mudar-se em ódio que moveu Caim a um ato de violência. A causa de não ter sido aceita a sua oferta era ele mesmo. Assim coloca o profeta Isaias – "Não, não é a mão do Senhor que é incapaz de salvar, nem seu ouvido demasiado surdo para ouvir, são vossos pecados que colocaram uma barreira entre vós e vosso Deus. Vossas faltas são o motivo pelo qual a Face se oculta para não vos ouvir," (Is 59,1-2).

Era contra si próprio que Caim devia virar-se, e não contra seu irmão Abel. Paulo afirma a seu respeito de si mesmo – "Homem infeliz que sou! Quem me livrará deste corpo que me acarreta a morte?..". (Rm 7,24).

          IV.      LUXURIA E CINISMO.

Fortes uns contra outros e violentos na prática do crime, os filhos dos homens são fracos para governar os seus instintos de luxuria. Na geração de Caim aparece o primeiro caso de poligamia. Mais grave ainda, Lamec proclama o crime que cometeu – "Lamec disse às suas mulheres: Ada e Sela, ouvi a minha voz: mulheres de Lamec, escutem as minhas palavras: Por uma ferida matei um homem, e por uma contusão um menino". (Gn 4,23).

Ao mesmo tempo em que a corrupção tomava esse impulso assustador, manifestava-se, de outro lado, o poder vitorioso do bem. Os homens começaram invocar o nome de Senhor. Surge e começa a geração dos piedosos. Assim termina o capítulo quatro – "Set teve também um filho, que chamou Enos. E o nome do Senhor começou a ser invocado a partir de então". (Gn 4,26).

O texto apresenta o desenvolvimento da civilização, com suas bases culturais e tecnológicas. Surge o homem político (da polis = cidade; Gn 4,17), o homem artista (Gn 4,21) e o homem artesão (Gn 4,22). A civilização, porém, nasce de Caim: auto-suficiência e violência se multiplicam cada vez mais, gerando uma sociedade fundada na hostilidade e na competição. Tudo perdido? Não. Surge também o homem religioso (Gn 4,26), que busca reunir novamente aquilo que o homem auto-suficiente divide e separa. Em Mt 18,21-22, o Novo Testamento apresenta a antítese da violência”. – Bíblia Pastoral.



CONCLUINDO.

Cremos que deve ser bom alvitre, fechar esta lição com uma palavra sobre “o caminho de Caim”, conforme a epistola de Judas, v 11 – "Ai deles, porque andaram pelo caminho de Caim, e por amor do lucro caíram no erro de Balaão e pereceram na revolta de Coré". (Jd 11). “O caminho de Caim”, na qual milhões estão percorrendo, é, sem dúvida alguma, o caminho para a morte.

Jesus fala, em seu sermão do Monte – Mt 7,13-14 – de dois caminhos. O caminho estreito, o qual podemos chamar de “o caminho de Abel” – o caminho do culto verdadeiro, o caminho da fé, o caminho da crucificação – "Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne, eu a vivo na fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim". (Gl 2,20). O caminho largo, que leva a perdição, é o caminho de Caim – o caminho da inveja, do orgulho e da superficialidade espiritual. “porque o Senhor conhece o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios conduz à ruína.” (Sl 1,6).