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sábado, 23 de fevereiro de 2013

GÊNESIS - 04 – A TEMPESTADE CHEGA.




Nos versículos iniciais de Gênesis 5, temos um relato histórico do modo de viver dos seres antediluvianos. Deste modo, percebemos a humanidade criada por Deus vivendo sob alguns aspectos à luz do objetivo impar de Deus, com múltiplas experiências:

1.    No viver com Deus –

Temos Enoque como referencial, representando alguém que teve sua vida espiritual, pessoal, intelectual permeada pela presença divina; era diferente dos demais de sua época (vv. 21-24).

2.    No viver familiar –

Havia amplo crescimento reprodutivo, gerando filhos e filhas.

3.    No viver secular –

Tinham consciência das dificuldades próprias da época. Viviam na expectativa de alivio para a angustia e estresse próprios daqueles dias. Percebemos esta tensão nas palavras de Lamec que, ao ser agraciado com a paternidade aos 182 anos  (bastante jovem para a época), desabafa a cerca de suas necessidades – "ao qual pôs o nome de Noé, dizendo: “Este nos trará, em nossas fadigas e no duro labor de nossas mãos, um alívio tirado da terra mesma que o Senhor amaldiçoou.”" (Gn 5,29) – consolo para o exaustivo trabalho nas buscas incessantes de oportunidades, consolo das fadigas das próprias mãos e livramento da maldição sobre a qual estava encerrada a própria terra. Interessante observarmos que é neste contexto conflituoso que nasce Noé; e seu pai Lamec antevê nele o consolo para estas lutas.

Na perspectiva dos antigos, a história é uma sucessão de gerações, de modo que contar a história, é contar a história das famílias. Notemos que a geração humana transmite para cada novo ser humano a originalidade com que Deus criou Adão: à imagem e semelhança de Deus (Gn 5,1-3). Assim, a salvação se mostra já presente na história. Para o Antigo Testamento, ser feliz é viver bastante. Salientando a idade, o texto quer mostrar o seguinte: à medida que o mal cresce, o homem é menos feliz, ou seja, vive menos (cf. Gn 6,3): antes do dilúvio, vive-se de 700 a 1.000 anos; depois do dilúvio, de 200 a 600 anos (cf. Gn 11,10-26); a partir de Abraão, de 100 a 200 (cf. Gn 23,1 etc.); mais tarde, de 70 a 80 anos (cf. Sl 90,10).” – Bíblia Pastoral.

I.              O ESTADO DA HUMANIDADE. (Gn 6:1-12).

Para um mundo jovem, o pecado atingira proporções imensuráveis – “Um abismo chama outro abismo ao ruído das tuas catadupas; todas as tuas ondas e vagas têm passado sobre mim”. (Sl 42,7). Os homens e as mulheres daqueles dias encontravam-se num estado de desintegração moral e espiritual, separados da comunhão com Deus e entregues às próprias paixões e concupiscências (Gn 1-4), portanto, em pecado – condição do homem sem a presença de Deus. Deus então olhou esses “homens” e constatou:



1.    O que Deus viu.  

a)    A carnalidade latente (v3).
b)    As maldades humanas em crescimento vertiginoso (v 5a).
c)    A persistência maldosa dos desígnios do coração humano (v. 5b).

2.    O que Deus fez.

Deus então analisou esses homens, se arrependeu de havê-los criado, e resolveu:

a)    Tirar a ação do Espírito Santo sobre o Homem – v3a.
b)    Diminuir o tempo de vida – v3b.
c)    Fazer desaparecer o homem da face da terra – v 7.

Novamente, numa situação conflituosa, Noé reapareceu na história bíblica, de forma decisiva – "Noé, entretanto, encontrou graça aos olhos do Senhor". (Gn 6,8).

Dessa vez não temos mais um pai terreno olhando suas próprias does e ansioso por diminuí-las, mas um pai Celeste, Deus, com a justiça derramando das próprias mãos; em busca de  uma solução não particular, mas universal. Ele também achou em Noé a graça” inexistente em seus contemporâneos (v. 9). Conseqüentemente começou-se naquele momento o julgamento da humanidade.

6,1-8: A auto-suficiência chega ao máximo da pretensão: o homem começa a considerar-se um deus ou semi-deus, projetando uma super-humanidade independente do projeto original de Deus. Vendo sua criação desfigurada, Javé decide exterminá-la. Tudo perdido? Não. A história vai continuar através de Noé, o homem justo.  Inspirada nas inundações periódicas dos grandes rios, a narrativa do dilúvio é típica das antigas culturas médio-orientais. Os autores bíblicos a utilizaram por causa do seu significado simbólico: o dilúvio é uma volta ao caos primitivo (compare Gn 1,6-30 com 6,17 e 7,18-24). Contudo, qual é o dilúvio que acontece na história? São os acontecimentos catastróficos gerados pela auto-suficiência, que chega a formas tão extremadas que produz o caos na natureza e no mundo humano. O texto é também uma apologia do justo: este sabe discernir a catástrofe e tomar uma atitude para sobreviver e preservar a vida. É através do justo que a história continua.(Bíblia Pastoral)


II.            A ACA PARA OS ELEITOS: JULGAMENTO E SALVAÇÃO.

A situação pecaminosa da humanidade exigia medidas radicais; fossem condenatórias ou salvificas. A arca naquele momento representava a alternativa transicional – julgamento à salvação para Noé e sua família. Embora estivessem livres das águas  diluvianas, no aspecto condenatório, eles  estariam sob as conseqüências das mesmas passando por:

1.    Um julgamento parcial e simultâneo ao:

a)    Construir a Arca – Gn 14-16 – a obediência seria fundamental quanto ao material, estrutura e desenho da arca, como também quanto aos que nela entrariam (Gn 6,19-22).
b)    Entrar na arca – este seria  o momento de dar as costas para o mundo conhecido e entregar-se pela fé numa rendição incondicional àquele que via  Noé como justo no meio de uma geração corrupta – Gn 7,1.
c)    Esperar – para começar a chuva; “um, dois, três... seis dias e ...”... nada de chuva. O que representaram para Noé esses dias de espera?

"No ano seiscentos da vida de Noé, no segundo mês, no décimo sétimo dia do mês, romperam-se naquele dia todas as fontes do grande abismo, e abriram-se as barreiras dos céus. "A chuva caiu sobre a terra durante quarenta dias e quarenta noites". (Gn 7,11-12).

"As fontes do abismo fecharam-se, assim como as barreiras dos céus, e foram retidas as chuvas". (Gn 8,2).

O texto é repetitivo porque mistura duas tradições, de épocas diferentes, sobre o dilúvio. A comparação com Gn 1,1-10 mostra que o dilúvio significa uma volta ao caos primitivo; quando a humanidade destrói em si a imagem de Deus, a conseqüência é a destruição de todo o mundo criado.” – Bíblia Pastoral.

2.    Uma purificação completa – Gn 7,21-23.

a)    Seu preço – extermínio de todos os seres (Gn 7,23);
b)    Exceção – Noé e os que com ele estavam (Gn 7,23b);
c)    Resultado duplo – salvação e condenação (Gn 7,21-23).

Salvação – para Noé e sua família, que ousaram crer e obedecer. Porque foram diferentes de seus contemporâneos – "Pela fé na palavra de Deus, Noé foi avisado a respeito de acontecimentos imprevisíveis; cheio de santo temor, construiu a arca para salvar a sua família. Pela fé ele condenou o mundo e se tornou o herdeiro da justificação mediante a fé". (Hb 11,7).

III.           A ARCA PARA OS IMPIOS: JULGAMENTO E CONDENAÇÃO.

"Pela fé na palavra de Deus, Noé foi avisado a respeito de acontecimentos imprevisíveis; cheio de santo temor, construiu a arca para salvar a sua família. Pela fé ele condenou o mundo e se tornou o herdeiro da justificação mediante a fé". (Hb 11,7).

Convém salientar que os humanos daquela época estavam tão “entregues a si mesmo”, aos cuidados do mundo – "Nos dias que precederam o dilúvio, comiam, bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. E os homens de nada sabiam, até o momento em que veio o dilúvio e os levou a todos. Assim será também na volta do Filho do Homem". (Mt 24,38-39), que não se aperceberam da sentença mortal que pairava sobre eles –  "se não poupou o mundo antigo, e só preservou oito pessoas, dentre as quais Noé, esse pregador da justiça, quando desencadeou o dilúvio sobre um mundo de ímpios;" (2Pd 2,5).

É bom notar a tipologia da arca como símbolo de Jesus - em Cristo a salvação para todos os que nele creêm.



IV.          ENCERRADO O PRIMEIRO JULGAMENTO DA HUMANIDADE.

Aparecia um novo mundo – "E eis que pela tarde ela voltou, trazendo no bico uma folha verde de oliveira. Assim Noé compreendeu que as águas tinham baixado sobre a terra". (Gn 8,11).

Descia uma nova família da arca – certamente não mais com entrara, pois quem testemunhara estas maravilhas certamente não seria mais o mesmo. (“um homem não entra duas vezes no mesmo rio; da segunda vez não é o mesmo homem nem o mesmo rio” – Heracílito de Éfeso, séc. Vi aC.).

Temos, nesse momento, a realização da primeira celebração no novo mundo - "E Noé levantou um altar ao Senhor: tomou de todos os animais puros e de todas as aves puras, e ofereceu-os em holocausto ao Senhor sobre o altar". (Gn 8,20).

O Senhor recebe, aspira, e conclui: “Doravante, não mais amaldiçoarei a terra por causa do homem porque os pensamentos do seu coração são maus desde a sua juventude, e não ferirei mais todos os seres vivos, como o fiz.” – Gn 8,21.


Através do justo, Deus começa uma nova criação (comparar 9,1-7 com Gn 1,28-30). A nova criação começa com uma oferta a Javé, que não deixa o homem ser dominado pelo caos. Ele promete nunca mais destruir a sua criação: doravante, ele aceita a ambigüidade humana (v. 21), que também é responsável pela ambigüidade do mundo e da história. Experimenta-se a graça na estabilidade da ordem natural, não obstante o contínuo pecar do homem.– Bíblia Pastoral.

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